Eles andam aí...


por João Vacas*

4 de Junho, 2008


No dia em que escrevo, decorre no Parlamento Europeu, em Bruxelas, uma petição anti-corridas. No dia seguinte, haverá uma conferência sobre o mesmo tema. Ambas as iniciativas se destinam a "marcar" uma outra de sinal contrário - que trará ao Parlamento grandes figuras do toureio como Enrique Ponce e El Júli - e mostrar aos parlamentares e funcionários europeus como são bárbaros os costumes dos espanhóis e portugueses."E o que é que isso interessa?" - perguntará o leitor enquanto passa os olhos pelos cartéis da próxima Feira da Agricultura - "É deixá-los a falar sozinhos.".Os mais confiantes dirão que o que se passa em Bruxelas não mudará a afición dos portugueses e que a Festa não corre perigo. Para isso, alegarão em seu favor as centenas de provocações gratuitas e os milhares de insultos que vimos recebendo dos (autoproclamados) amigos dos animais e que não tiveram outro resultado senão o aumento de espectadores nas corridas e do número de jovens envolvidos em actividades tauromáquicas. Poderão até recordar com humor algumas "profecias" provindas desses sectores e que apontavam para o fim das corridas de toiros num período de três anos.Percebo essa serenidade e alegria mas não partilho delas. Sobretudo quando constato que, se pudessem, eles nos prenderiam a todos. Não estou a brincar, é precisamente isso que prevê o artigo 164.º da proposta orientadora para um futuro Código de Protecção dos Animais da autoria da Associação Animal, apresentado como "Moderno, Eficaz, Progressista e Justo"...:
1. O CPA deve prever como crimes puníveis com pena de prisão os actos consistentes em organizar, participar, realizar, apoiar ou encobrir, em qualquer circunstância ou por qualquer modo: (...)
e) Corridas de touros, largadas de touros e quaisquer actos tauromáquicos que envolvam a inflicção de sofrimento físico ou psicológico e emocional, lesões e ou morte a touros, outros bovinos e a equídeos;

Na sequência de semelhante ofensiva contra estas e outras práticas do Mundo Rural, também previstas e condenadas pelo projecto da Associação Animal, duvido que as cadeias em Portugal chegassem para acolher todos os toureiros e aficionados, caçadores, participantes em raides hípicos, artistas circenses, etc. Culpados, todos eles, de "crimes contra animais com fins recreativos ou desportivos". Crime público, note-se, devendo as autoridades que tiverem conhecimento deles encaminhar um processo para o Ministério Público, sem necessidade de existência prévia de qualquer queixa. A esse título, não deixam de ser dignos de nota os poderes que a Associação Animal reclama para as Organizações Não-Governamentais de Protecção dos Animais (ONGPA) e que, a serem-lhes atribuídos, as erigiriam em verdadeiras guardiãs do "progresso moral" de que se julgam arautos: direito a intervir como assistentes em juízo (art. 229.º); reconhecimento como pessoas colectivas de utilidade pública (art. 233.º); direito de consulta e informação junto dos órgãos da Administração Pública (art. 234.º); direito de participar na definição da política e das grandes linhas de orientação legislativa (art.235.º); direito ao estatuto de parceiro social para todos os efeitos legais, designadamente o de representação no Conselho Económico e Social e nos órgãos consultivos da Administração Pública (art. 236.º); isenção de emolumentos e custas (art. 240.º); isenções fiscais (art. 241.º); direito a apoio institucional e financeiro do Estado, através da administração central, regional e local (art. 243.º) e direito de antena (art. 244.º).Não contentes com isso, os dirigentes destas organizações reclamam para si um horário de trabalho flexível, 10 dias de faltas justificadas por ano sem perda de remunerações e regalias e, no caso dos estudantes, a equiparação ao estatuto de dirigente associativo (art. 237.º). Nada mau.Entendamo-nos: estamos a lidar com fanáticos. Gente que nos despreza e que ignora tanto quanto odeia o nosso modo de vida. Gente que não nos entende nem tentará qualquer esforço para o conseguir. Gente que distorce a realidade das corridas para as tornar abjectas e sombrias aos olhos dos ignorantes. Gente para quem "a espécie humana precisou de seguir uma linha evolutiva completamente diferente dos porcos ou das galinhas, por exemplo – e não significa mais do que isso". Gente para quem até "a opção de continuar a comer animais e produtos animais não pode ser considerada". Gente que abraçou messianicamente esta causa e que não recuará até a impor de forma totalitária, como é próprio dos falsos profetas. Gente que compensa o insucesso dos seus esforços para erradicar as corridas - que se saldam normalmente em acções de puro vandalismo passíveis, elas sim, de acção penal - com a tentativa de condicionar políticos europeus que, em boa parte, desconhecem a origem, prática, tradição e realidade tauromáquicas dos nossos países. Gente que procura valer-se de instituições incompetentes quanto à matéria ou grupos de membros dessas instituições para pressionar os Estados e assim criar um "caldo de cultura" avesso à tauromaquia e que espera que este se transmita aos decisores nacionais. É bom que fique claro que pretendem educar-nos por via penal. Querem "civilizar-nos" através da instituição de um Estado Policial ao serviço do vegetarianismo mais radical e militante. Neste quadro de franca ofensiva da intolerância, da ignorância e do autoritarismo e da tentativa de imposição insidiosa de uma mundividência ultra-minoritária a todos os portugueses, tomar por garantidas as liberdades de que dispomos é meio caminho andado para as perdermos.
Organizem-se e reajam. Eles andam aí.


*João Vacas é licenciado em Direito pela Faculdade de Direito de Lisboa e assessor no Parlamento Europeu. Foi forcado do Grupo de Forcados Amadores de Santarém nos anos 90.
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